terça-feira, 31 de outubro de 2017

As miniviolências do dia a dia - Parte I

Ir pra aula de música é algo que me traz muita alegria pelo motivo óbvio de desenvolver musicalidade aprendendo um instrumento. Entretanto, eu não dirijo. Então preciso de transporte público pra me deslocar até a escola de música. Não que isso seja um problema, eu até gosto de andar de ônibus e não esquentar a cabeça com trânsito, estacionamento, etc. Mas minha alegria por tirado notas boas se perdeu em meio a miniviolência que toda mulher que usa transporte público parece destinada a sofrer.

Eu costumo preferir esperar pelo ônibus mais vago. Hoje a sinusite em crise me fez optar pelo primeiro ônibus que viesse. O começo da viagem foi ok. A medida que o ônibus saía do centro da cidade e se aproximava da região na qual moro, o ônibus ficava cada vez mais lotado. Notei uma pessoa perto de mim, mas não dei atenção. Comecei a sentir muito próximo, a pessoa friccionando parte do corpo dela em mim a cada freio do ônibus. Olhei ligeiramente pelo reflexo do vidro fumê e me pareceu uma mulher. Tudo bem. Deixa pra lá. A fricção continuou e olhei pro lado. Era um homem com uma ereção visível na bermuda de tactel ridícula que ele usava. Olhei pra cara dele com raiva. Ele botou a mochila que carregava na frente e mudou de lugar.

Eu fiquei com ódio. Pensei em gritar, armar um barraco, pisar com força em cima do pé, enfiar uma caneta no pênis ou dar um singela cotovelada na cabeça quando passasse pra descer do ônibus. Não fiz nada. Gelei. Um misto de choque e nojo me impedia de querer memorizar o rosto do homem pra denunciar o assédio. Eu só queria descer do ônibus e ir pra casa. "Eu sou só mais uma que viveu isso. Várias vivem situações muito piores", pensei. E me percebi no mesmo estado em que várias mulheres no mundo que não reagem, que se sentem entorpecidas diante de violência sexual mesmo querendo fazer um escândalo. Parafraseando a Clara Averbuck, também virei estatística. 

Adianta denunciar à polícia? Não tenho nenhum vestígio de violência no corpo, apesar de que esfregar a genitália em outra pessoa constituir uma violência e segundo muito se fala na mídia, só a minha palavra basta. Mas vamos encarar a realidade? Em média, 135 mulheres foram sexualmente violentadas todos os dias só em 2016 e tem menos de 7 mil pessoas cumprindo pena por estupro. Tendo isso em mente, mesmo se eu denunciasse, mesmo se ele fosse preso, era bem capaz de algum juiz mandar soltar o nojento no dia seguinte alegando que "não houve constrangimento".

O mundo é misógino. Mulheres são educadas a andar de cabeça baixa e se calar. E foi exatamente o que eu fiz, tive medo de ser vista como mentirosa e louca e só me dei conta disso agora, horas depois do que aconteceu. E é justamente por isso que eu escrevo aqui. Se você sofreu violência, não importa o lugar, o horário ou o agressor, denuncie. Faça um escândalo, chame atenção onde você estiver. Não faça o que eu fiz. Eu mesma não ficaria calada se pudesse ter agido racionalmente naquele exato momento. Se o seu caso for mais grave que o meu, não guarde pra si mesma o que aconteceu, não se culpe e nem duvide de si mesma. Denuncie, divida com alguém, procure ajuda. Essas violências, sejam elas pequenas ou grandes, ficam marcadas durante a vida toda. Eu bem sei disso. Mas essa outra história fica pra outro dia.

sábado, 30 de setembro de 2017

Andando em círculos

Ultimamente tenho visto muitas questões que eu achava que haviam sido compreendidas e superadas voltarem à tona de maneira tão ou mais ignorante do que antes. Começou com a história da Terra plana. Tem inúmeros estudos que explicam porque a Terra é redonda, mas apareceu sabe-se lá de onde um grupo de pessoas que defendem que a Terra é plana. Mesmo com as fotos do espaço, os estudos matemáticos e outras provas científicas, tem uma galera que acredita que o conceito da Terra redonda é uma criação do governo americano. Existem experiências científicas realizados há mais de 2 mil anos que comprovam que a Terra é redonda, mas é tudo criação da NASA pra dominar o mundo. 



Depois veio o movimento antivacina, em que os adeptos acreditam que contém elementos químicos cujos efeitos colaterais da vacina são nocivos às crianças porque desregulam o sistema imunológico e podem levar à morte. Diferentemente da questão da Terra Plana, o impacto desse movimento é bem perigoso, pois casos de doenças que já haviam sido erradicadas através da vacinação (como o sarampo) voltaram a aparecer na Europa.



A última foi a autorização pela justiça do tratamento psicológico de homossexuais. Apesar de parecer só mais uma decisão judicial equivocada de um juiz sem noção, isso abre brecha para os "psicólogos cristãos" voltarem a praticar a cura gay, mesmo sendo uma ação proibida pelo Conselho Federal de Psicologia e passível de cassação do registro de psicólogo, mesmo indo de encontro ao que a Organização Mundial de Saúde defende. Pensa comigo: se tem gente que acredita que a Terra é plana mesmo com embasamento científico nenhum, como é que não vai ter gente que não vai forçar o filho "com trejeitos" a terapias de reversão sexual? 

O mais preocupante de tudo isso é que isso pode levar muitas pessoas a serem submetidas a "tratamentos" forçados e desnecessários para curar algo que não é doença. Isso, além de ser um charlatanismo sem tamanho, é uma mentira que gera um sofrimento psíquico não só para quem faz o "tratamento" porque é obrigado a acreditar que não é normal, mas também para todos (familiares, amigos) que esperam resultados dessas "sessões de cura".



É realmente estranho imaginar que todas essas questões, que já haviam sido desmentidas há muito tempo, pudessem retornar do nada, especialmente com a maior facilidade de acesso à informação atualmente. Mas em uma sociedade que nunca parou de compartilhar correntes que dizem ajudar crianças doentes fictícias ou sobre legalização da pedofilia, fica difícil saber se estamos caminhando pra frente ou só andando em círculos. A solução desses três casos é a mesma: conhecimento. Só resta esperar que esse conhecimento gere mudanças de ideias e atitudes, e que essas sejam, de preferência, mais humanas.

terça-feira, 25 de julho de 2017

Amantes, briga de mulher e novelas

Hoje quase todo mundo que eu conheço parou o que estava fazendo pra ver a briga entre três personagens da novela das 21h. E isso me lembrou um texto que eu li há bastante tempo (não me recordo de quem era o texto, por isso peço perdão por não dar a referência) que falava várias coisas não só sobre feminismo, mas sobre relacionamentos e traições que me fizeram refletir muito na época e mudar a forma como eu via esse tipo de situação.

Obs: Vou utilizar como contexto um relacionamento e uma traição heterossexual por conta da novela. Eu sei que há várias situações que podem diferir não só quanto à sexualidade, mas eu considerarei o exemplo da trama para falar de estereótipos da teledramaturgia que a sociedade tende a copiar.

Tem três coisas muito erradas em ter gente comemorando o fato de duas mulheres brigarem por causa de um homem. A primeira é que não se pode jogar toda a culpa da traição e das consequências que isso pode trazer na outra. Sim, ela foi escrota em não respeitar o relacionamento do casal, mas isso não a torna "pivô" de separação. Ela é mera desculpa. Assim como foi ela, podia ser qualquer outra mulher. O culpado da traição é quem traiu, não a outra com quem ele escolheu trair, afinal a outra não faz parte do relacionamento. Sei que a personagem da Débora Falabela é uma nojenta, mas essa de "mas ele é homem e de tanto a Irene insistir" é motivação mais ridícula e não justifica. Ele traiu porque quis, a culpa da traição é dele e só dele.

Em segundo lugar, briga entre mulheres na teledramaturgia tem sempre aquele pano de fundo machista e precisa ser só quando uma mulher descobre que o parceiro a trai com a amiga. A briga é colocada sempre de forma a vender a ideia de que amizade entre mulheres é muito frágil. Um namorado mais atencioso, um emprego bacana, uma faltou a festa da outra e até um cabelo mais bonito (vide a infinita rixa Serena x Blair durante quase todos os episódios de Gossip Girl) é motivo pra transformar uma amizade numa sucessão de puxões de cabelos, mulheres rolando no chão sensualmente, de preferência uma sentada por cima da outra que apanha sem revidar muito. Isso cria no imaginário das mulheres que não devemos confiar umas nas outras e não ganhamos nada com isso. Mas os homens ganham e muito. E eu não estou falando de ereções porque tem duas mulheres simulando uma cena de briga que parece ter saído do Xvideos.

E por último: vocês acham bonito gente brigando? De verdade? Acham mesmo que alguém merece apanhar? Essa cultura de "fulano mereceu apanhar" é justamente o que fundamenta o racismo, a lgbtqfobia, a violência doméstica. Sim, porque o mercer apanhar é bem subjetivo. Enquanto pra uns a Irene mereceu apanhar por roubar o marido da Joyce, pra vários bandido merece apanhar na cadeia, outros acham que lésbica tem que ser estuprada pra aprender a gostar de homem, esposa merece apanhar por não fazer o almoço que o marido queria, crianças e idosos dão trabalho e merecem um corretivo e por aí vai. Exagero? Não mesmo. Dá uma olhada nos sites de notícias pra ver a quantidade de homicídios pelos motivos mais triviais.

Muita gente não vê nada demais na briga, muitos estão aplaudindo a taca e alguns achando até que foi fraco. Podem alegar que é só ficção. Mas não é. A dramaturgia vive de reproduzir vivências reais porque é isso que chama atenção, é o que prende as pessoas diante da TV mesmo hoje com uma variedade enorme de conteúdo on demand. O que quero dizer com tudo isso é que é preciso ter muito cuidado com o que vendido na televisão e quanto dessa cultura de novela é assimilado pela nossa sociedade. Nunca se sabe quando se está reproduzindo um costume que, pelo bem da vida social humana, nem deveria mais existir.

sexta-feira, 16 de junho de 2017

A toxicidade do vai e volta

Vou aproveitar que estamos na semana do dia dos namorados e da festa de santo Antônio pra falar de um assunto que eu acho bizarro, que vejo acontecer ao meu redor o tempo todo, é uma questão bem problemática, mas que as pessoas costuma fazer pouco caso disso sabe-se lá porquê.

Terminar relacionamentos é sempre horrível. Por mais que o casal tenha durado pouco tempo ou nem seja tão apaixonado assim (galerinha que curte medir sofrimento ama usar esses argumentos,né?), é normal sofrer, se sentir tentado a entrar em contato com ex e reatar. Às vezes, tudo se ajeita e o casal vive feliz, às vezes a gente quebra a cara e segue em frente. E tudo bem. Não tem como prever que as coisas podem dar certo ou errado depois que termina e volta. O problema é quando o vai e volta passa a se repetir.

Nunca passei por essa experiência, mas já percebi que esses casais que terminam e voltam mais de uma vez tem sérios problemas de comunicação. Não interessa se é por ciúmes, por teimosia, se é porque a tampa da privada não estava abaixada ou se a pasta de dente foi apertada no meio. Se todo encontro do casal acaba em briga, como isso pode ser sinal de amor? A gente vê tantos exemplos de casais vivendo esse vai e volta interminável (sertanejo universitário, novela das nove, Rachel e Ross mandam lembranças)  que a nossa cultura acaba normatizando esse tipo de relacionamento. Mas  o termina e volta virar costume não significa que seja ok viver um relacionamento assim.

Se tem uma coisa que me dá aflição são esses casais que uma semana estão morrendo de amores e daqui a três dias terminam e ficam se lamentando nas redes sociais. Não vou nem entrar na questão da vida fake nas redes sociais porque nem precisa 😏... Mas eu fico imaginando que deve ser muito desgastante não ter uma única semana de tranquilidade no namoro. Esse terminar, voltar e repetir esse ciclo inúmeras vezes durante meses e até anos... Pra quê? Pra não ficar só? Porque já se acostumou com o outro? Porque já passou dos trinta e vivem te dizendo que chegou a hora de sossegar? Não tem como levar a sério um casal que não consegue resolver desentendimentos triviais e tá sempre por um fio.

Relacionamentos exigem muito mais que paixão e desejo. É preciso haja diálogo, paciência e compreensão para tornar um namoro qualquer em compromisso, seja da espécie que for. A gente não tem que ficar com alguém pra não ficar só. A existência do outro na nossa vida afetiva tem que ser uma alegria, um prazer, um aprendizado. Não é pra ser um fardo. E essas idas e vindas incessantes tornam o que era pra ser uma relação de amor em um looping infernal infinito.

Novamente: nunca passei por isso. E mesmo que tivesse, cada casal tem suas peculiaridades quanto às razões que levam ao termina/volta e por esse motivo não faz sentido enumerá-las. A questão central é ressaltar que esses relacionamentos ioiô frustram, desgastam e isso​ precisa parar. Não romantize brigas, não alimente inseguranças, não se prenda a relações tóxicas. Se você deseja que seu relacionamento perdure, leve a sério e não permita que se acabe por acúmulo de assuntos mal resolvidos. Ter alguém ao lado dá trabalho, ter DRs realmente não é legal, mas isso sim é que faz parte da vida de casal. E lembre-se: só vale a pena insistir se te faz mais feliz. Se não acrescenta mais, deixa ir.

quinta-feira, 18 de maio de 2017

Não é como perder um amigo

Não sou muito de grunge. Compreendo a fascinação da galera da época porque era um som que vinha muito a calhar com realidade do fim da década de 1980 e começo dos anos 90. Entendo perfeitamente porque gostam tanto de Alice In Chains, Pearl Jam e a idolatria pelo Kurt. Mas se tem um cara desse tempo que gosto é do Chris Cornell. Bonito, vozeirão, posudo, talentoso. Chris fez parte de três bandas, carreira solo, escreveu trilhas de canções pra filmes, ganhou grammies e ainda fez show em Cuba bem antes de os EUA cogitar voltar a se relacionar com o país.

E o que me cativou foi justamente o Audioslave. Ele imprimiu toda a personalidade dele nas músicas em uma combinação perfeita com a musicalidade do Tom Morello, Tim Commerford e Brad Wilk. Eu via muita gente falar que a banda era só uma junção do Rage Against The Machine com o Soundgarden, mas os arranjos e a sonoridade pura de hard rock iam muito além das críticas. Pra quem cresceu nos anos 2000 e viveu a aparição irritante do Eminem, a vibe mais ou menos do New Metal e a absurda quantidade de cantoras pop criadas pela indústria fonográfica em crise, ouvir algo como o Audioslave era não só um alívio. Era um prazer mesmo. Chris saiu do Audioslave, focou na carreira solo muito bem sucedida, diga-se de passagem, bem como os outros membros focaram em seus respectivos projetos. E eles retornaram pro show anti-inaugural a posse do Trump. 

De tanto ouvir rumores, ver notícias com os caras considerando a possibilidade de o Audioslave voltar e com o show anti-Trump, eu esperava um album novo em algum momento. Infelizmente, a chance de retorno morreu hoje de manhã com a notícia de falecimento do Chris. Ele lidava com transtornos decorrentes do uso de drogas e em se tratando de álcool, como era o caso dele, a coisa é ainda mais complexa, já que o álcool é uma droga diretamente relacionada à depressão a longo prazo. 

É difícil não associar o suicídio do Chris com o passado complicado dele. Especialmente porque muitos dos músicos contemporâneos deles que passaram por situações semelhantes não estão mais aqui pra contar história. Mas minha esperança de fã sonhava com a possibilidade de ele vir a seguir o exemplo do Steven Tyler, não o do Kurt Cobain. 

Perder um ídolo não é como um amigo. A sensação é mais perder parecida com perder uma inspiração, um norte. O fato de eu cantar sempre me faz olhar com mais atenção e carinho por cantores e o Chris era uma referência pela voz, presença de palco, estilo. E a do Chris era desinibida, sofrida, forte. Eu procuro pensar que a vantagem dos músicos falecidos é que eles se eternizam em cada música, mas a verdade é que não há nada mais triste do que saber que não vai haver material novo pra apreciar. De qualquer forma, vivi pra ver um músico incrível como o Chris reinventar, nadar contra a corrente do showbussiness, quebrar barreiras políticas e se reinventar quantas vezes mais foram necessárias. Obrigada por isso. Vá em paz, Chris.


sexta-feira, 5 de maio de 2017

Já passou da hora de a zoeira acabar

Vídeo de pegadinhas sempre foi motivo de audiência. O quadro de videocassetadas do Faustão deve ser tão velho quanto o programa em si. E é natural que a popularização de sites que permitem uploads de videos por qualquer pessoa também traga consigo os videos de pegadinhas. Não sei se tô mal informada, mas notei que de uns tempos pra cá os videos de pranksters são tão comuns quanto tutoriais de maquiagem. A questão é que a coisa tem tomado um rumo bem preocupante.

Ao buscar por pranks/pegadinhas no Youtube ou olhar nas opções Em Alta ou Humor, já aparecem vários canais e videos. E por mais que alguns videos sejam encenados, é bem estranho que pegadinhas de conteúdo duvidoso façam tanto sucesso. E quando eu falo em conteúdo duvidoso, eu tô pegando leve. Como alguém pode achar engraçado botar câmera em um banheiro feminino? Sério que alguém pensou que seria uma boa ideia fazer uma pegadinha oferecendo a negros passagens de avião pra que eles voltassem pra África? Ou que é ok fazer piada em que o cara bate na namorada e a arrasta pelo chão da sala após descobrir que ela supostamente estava trocando mensagens de texto com outro homem? E a pegadinha de casal em que o moço que decidiu ter relações sexuais à força com a namorada segurando-a pelo pescoço?

A coisa tem ficado feia pra alguns desses youtubers famosos como o PewDiePie, que perdeu vários patrocínios depois de pagar duas pessoas pra fazer uma pegadinha antissemita. Essa semana, o casal do canal DaddyOFive perdeu a custódia de dois de seus cinco filhos sob a acusação de abuso infantil, tendo como evidência videos em que os pais aparecem gritando e xingando as crianças, filmando brigas entre elas e inclusive cenas de agressão como no video em que o pai empurra a cabeça de um dos filhos contra uma rack de TV.

Como isso tudo tem passado despercebido no Youtube eu não sei, mas o aspecto mais gritante nisso tudo é: será que esse pessoal realmente não percebe que as pegadinhas que incitam racismo, misoginia e abuso infantil são perturbadoras? A dignidade e o bom senso dos youtubers se perdeu no meio da grana de patrocinadores e dos likes? E olha eu nem falei de pegadinhas que maltratam bichos porque mal consigo imaginar uma cena sem querer chamar a polícia.

Não sei dizer se as pessoas gostam desses canais ou desses tipos de video poque ver alguém sendo humilhado faz com que elas não se sintam tão na merda ou se é porque elas são escrotas mesmo. Talvez ambos, vai saber... O ponto central aqui é que se precisa enxergar que há coisas que não podem ser transformadas em piada nunca porque se corre risco de normalizar formas de violência. Violência e discurso de ódio não são piadas ou liberdade de expressão. Não faço ideia de quando a maldita zoeira vai acabar. Mas posso afirmar com muita convicção que já passou da hora.

terça-feira, 25 de abril de 2017

Sobre o que merece ser visto até o fim

De vez em quando eu gosto de assistir documentários e essa fim de semana escolhi assistir The Human Experiment (que eu recomendo muito se você for da área de saúde ou se você for curioso mesmo) e Patterns of Evidence - Exodus. Esse último me gerou um desconforto terrível. Não, não é porque eu sou católica e escolhi acreditar que na migração do povo hebreu do Egito para a Terra Prometida, mesmo sendo um evento pouco provável cientificamente. É a questão de que o moço que conduz a investigação é claramente mentiroso e pedante.

(O próximo parágrafo vai ser só eu implicando sobre o quão enfadonha é a abordagem desse doc, então pode pular, eu deixo... )


No começo do documentário, ele diz que não tem interesse em fazer a investigação porque sente que vai acabar descobrindo informações que podem gerar polêmicas, mas fica insistindo em questões sobre as quais ele já encontrou respostas. Tá bom, eu sei que em casos de investigações acerca de fatos históricos, é importante buscar mais de uma fonte e entrevistar vários especialistas. Mas moooooço... O senhor tá há uma hora duvidando que o Êxodo aconteceu na época do Ramsés, já encontrou vários especialistas que repetiram categoricamente o Êxodo deve ter acontecido antes do Ramsés, eu já entendi. Investiga outra coisa, cara! O livro do Êxodo é riquíssimo em coisas pra pesquisar, deixa o Ramsés em paz lá na pirâmide dele.


O meu maior desconforto com esse doc não é só o ponto de vista do qual ele foi construído, mas é com a minha insistência em continuar assistindo algo que eu não gostei. Por sinal é uma coisa que eu percebo que tenho feito muito. Fiz isso com livros, com séries, filmes... Por quê? Bom, aprendi com uma pessoa que mesmo se eu não gostar de algo, eu preciso ver até o final pra ter certeza se gosto ou não e saber explicar claramente os motivos pelos quais eu não gosto. 

Convenhamos que essa técnica é bem útil se pra um crítico de cinema, um jornalista de cultura ou um blogueiro desse nicho. Pra mim, são só horas perdidas com algo que só me deixou entediada. Não vou sair discutindo ou doutrinando ninguém contra o documentário. Até porque depois que eu postar esse texto, é provável que eu nunca mais faça menção a ele e nem sobre os livros e as séries que eu não gostei mas persisti só pra ter certeza de algo que eu já sabia.

Existem exceções a regra, claro. Se eu não tivesse passado do episódio piloto de Parks And Recreation, eu teria deixado de gargalhar por horas. Mesmo não gostando de 13 Reasons Why (essa eu não recomendo por ser um desserviço à saúde pública), sem ter assistido até o final eu não teria conhecido várias bandas indie que estou amando há semanas. Mas em geral, eu poderia ter passado todo o tempo que gastei assistindo ou lendo coisas que não interessavam fazendo algo que eu realmente queria fazer.


Agora que tenho consciência do desperdício de tempo e já que eu não vou chegar em mesa de bar nenhuma elencando as razões pelas quais eu prefiro tomar vários choques ao abrir a geladeira do que assistir How I Met Your Mother, Girls ou Clube da Luta, seguem algumas recomendações de amiga pra que você também não perca tempo:

a) livros: não julgue pelo prefácio. Ele é só a opinião de uma pessoa. Mas se você leu o primeiro capítulo e não teve vontade de continuar, tudo bem. Dê de presente ou venda-o online;
b) séries: passe do piloto. Chegou no episódio 3 e tá morrendo de tédio? Assiste outra coisa. É pouco provável que valha a pena continuar;
c) filmes: aguarda meia hora de filme. Se o enredo, a fotografia, as atuações ou o roteiro não te prenderem é porque esse filme não é pra você;
d) artistas/bandas: ouça mais de uma música, mas não precisa ouvir o album inteiro se o estilo, as ritmo, as letras ou os arranjos não te agradam.

Ah! Se você passou pela mesma situação que eu de ter assistido/lido muito conteúdo desinteressante, recompense-se com algo que você não se cansa de ler, ouvir ou assistir. Criar uma zona de conforto pode gerar uma tendência a preguiça, mas eventualmente é bom ter algo familiar e reconfortante pra relaxar, rir ou olhar sob uma nova perspectiva.